Foz do Iguaçu – PR – Fábio Medina Osório (foto), um dos maiores especialistas brasileiros na área, afirma que instituições precisam atuar de forma coordenada. O jurista Fábio Medina Osório, um dos maiores especialistas brasileiros em Lei de Improbidade Administrativa e Lei Anticorrupção, esteve em Foz do Iguaçu, onde ministrou palestra no Congresso Brasileiro de Gestores e Membros de Comissão de Concurso.
O tema foi “Aplicabilidade da Lei Penal e da Lei da Improbidade Administrativa no Concurso Público”. Em entrevista exclusiva à Gazeta, Fabio Medina analisa vários aspectos jurídicos e aponta como devem agir as instituições para maior eficácia da nova lei.
Gazeta – As leis existentes no país, se aplicadas, já são suficientes para combater a corrupção?
Fábio Medina: Entendo que sim. O Brasil tem um arcabouço normativo muito robusto e que vem avançando de modo consistente. Obviamente teve um fecho importante nesse sistema com a edição da Lei 12.846/2013, que é a chamada Lei Anticorrupção, que torna mais rigoroso esse ciclo punitivo alcançando as pessoas jurídico-privadas, independentemente da presença de agentes públicos no pólo passivo. Esta lei anticorrupção ou Lei da Improbidade Empresarial possibilita medidas coercitivas muito relevantes para apurar responsabilidades de empresas e seus dirigentes. O que é necessário é que as instituições funcionem, saibam investigar e atuem de modo coordenado e com um planejamento estratégico para obter resultados.
Gazeta: A gente vê o MP entrando com ações com muita frequência, mas quando chega no judiciário nem sempre consegue uma condenação.
Fábio Medina: Não há um diagnóstico qualitativo apurando, por exemplo, a eficiência das instituições fiscalizadoras. O que seriam as causas da impunidade? Há um déficit na investigação? Há um déficit nos processos? Problemas de nulidades? A falta de qualidade na produção probatória? Então vejo que é importante o MP cada vez mais aperfeiçoar sua capacidade investigatória. A organização do estado brasileiro, a ação planejada, estratégica é que vai permitir uma maior qualidade, a meu ver, no âmbito dos processos investigatórios e dos processos punitivos.
Gazeta: A Frente Nacional de Prefeitos questiona o que classifica como excessos praticados pelos promotores. Considerando essa fala da FNP, existe espaço para que haja algum tipo de perseguição aos gestores?
Fábio Medina: A Lei de Improbidade é muito vaga, mas isso é uma característica dos sistemas normativos contemporâneos, uma certa ambiguidade, o uso talvez abundante de conceitos jurídicos indeterminados, cláusulas gerais. Os sistemas normativos contemporâneos, inclusive no direito comparado, eles têm esse traço comum, então isso aumenta muito a discricionariedade das instituições fiscalizadoras. Aumentou muito o poder, o espaço de movimentação dos atores judiciais. Quando eu falo atores judiciais eu me refiro aos advogados, membros do MP, aos juízes, inclusive. Isso, obviamente, pode possibilitar desvios de poder, de finalidade e até equívocos funcionais, na interpretação da lei. Portanto entendo que sim, pode haver um contexto que revele uma fonte legítima de preocupação para os gestores públicos.
Gazeta: Especificamente, quais os princípios básicos que configuram uma improbidade administrativa?
Fábio Medina: Na verdade podemos partir de uma premissa de que a improbidade exige uma grave desonestidade funcional, uma grave ineficiência funcional. Tudo isso tem que ser dimensionado à luz das provas produzidas, à luz de cada caso concreto. Quando um gestor toma uma decisão, muitas vezes ele tem uma margem de erro bem tolerável. Ele tem que ter, todos têm. É o chamado erro profissional. Médicos têm, o engenheiro tem, o advogado, o juiz. Quando o juiz tem uma decisão reformada por um Tribunal foi porque ele errou na sentença, mas não é por isso que ele está incorrendo em uma falta disciplinar. Da mesma forma o gestor público, ele tem que ter essa margem. A caracterização da improbidade vai depender de uma causa holística que revele portanto uma conduta gravemente desonesta ou gravemente ineficiente que vulnere dispositivos legais explícitos e que acabe sendo passível de uma tipificação na lei 8.429/92.
“Cerco está se fechando para gestores corruptos”
Jurista ressalta fortalecimento da liberdade de imprensa, cobrança da sociedade e marco na independência das instituições
Ao comentar sobre prisão de acusados em escândalos de corrupção, o jurista Fabio Medina Osório aponta que o cerco está se fechando para quem vive de irregularidades no serviço público. Segundo ele, alguns fatores contribuem para esse novo momento como o fortalecimento da liberdade de imprensa, cobrança da sociedade e maior independência das instituições.
Gazeta: Estamos vendo políticos indo para a cadeia. O senhor diria que o cerco está se fechando contra os corruptos?
Fábio Medina: Não tenho dúvida disso. O fortalecimento da liberdade de imprensa dando mais luz sobre as patologias e ao mesmo tempo a existência de um marco institucional mais avançado de instituições independentes e republicanas que atuam no combate à má gestão pública revela um risco muito maior para quem vive da corrupção. Então a sociedade tem cobrado das instituições fiscalizadoras uma série de resultados. Isso reflete no fechamento desse cerco em torno do gestor público. O Direito Penal, através de suas instâncias, com penas privativas de liberdade, e no âmbito da improbidade com todas essas outras medidas que também são restritivas de direitos, como suspensão de direitos políticos, perda do cargo, proibição de contratar com a administração pública ou dela receber benefícios fiscais ou de qualquer natureza, ainda que indiretamente, pagamento de multa civil, perda dos bens. Quer dizer, temos aí um conjunto bastante amplo de sanções que tem atingido aqueles que mergulham no universo da corrupção.
Gazeta: O caso do Petrobras, como o senhor analisa esse fato e pergunto também porque se chegou a esse nível de corrupção e se os acusados podem escapar impunes?
Fábio Medina: O ambiente que favorece a corrupção normalmente é um ambiente de ineficiência, é um ambiente sem transparência, opaco, sem controle. A Petrobrás basta notar que apenas recentemente instituiu uma diretoria de governança corporativa, até então não tinha. Provavelmente houve esse descontrole que permitiu uma invasão do âmbito político e técnico. Uma captura de técnicos pelo universo político e que proporcionou um espaço ideal para corrupção e que acabou servindo, ao que tudo indica, como um projeto para financiar perpetuação do poder de pessoas que estavam nessa estruturas.
Não sei se tem margem para que os acusados possam escapar. A verdade é que os direitos fundamentais dos acusados não constituem obstáculo para a aplicação das leis. Não é necessário atropelar direitos para poder aplicar corretamente as leis, basta que as autoridades saibam trabalhar bem, tenham o conhecimento das leis e trabalhem respeitando os direitos das pessoas que são investigadas e atingidas por processos judiciais.
Gazeta: De que forma a reforma política pode ajudar no combate à corrupção?
Fábio Medina: É uma competência do Congresso a reforma política. Não cabe ao Judiciário, e obviamente que pode criar, por exemplo, um marco regulatório mais transparente, mais saudável para os financiamentos de campanha e acho que principalmente reduzir o custo das campanhas eleitorais. É um custo muito alto que acaba gerando a necessidade de captação de recursos. Isso não tenho dúvidas que pode ser um problema, porque uma participação muitas vezes pode ser espúria do setor privado nesse processo.
Lei Anticorrupção precisa ser sancionada no Município
É responsabilidade dos prefeitos sancionar, no âmbito do Município, a Lei Anticorrupção. De acordo com o jurista Fabio Medina Osório, o chefe de Executivo que não editar decreto regulamentando está incorrendo em omissão e pode ser responsabilizado. Foz do Iguaçu está entre os municípios que ainda não regulamentou.
Conforme declarou, o jurista, cada um dos municípios tem que ter a responsabilidade de regulamentar a lei. “Vai regulamentar porque naqueles contratos celebrados com os municípios, as empresas vão estar sujeitas aos regulamentos do município, e a mesma forma com os estados. Quem não está fazendo está sendo omisso e eventualmente pode vir a ser responsabilizado pelo Ministério Público”, comentou Medina. (Foto: Roger Meireles)